COPEN lança nota com medidas que precisam ser adotadas para evitar tragédias no Sistema Penitenciário cearense


prisãoO Conselho Penitenciário do Estado do Ceará (COPEN), órgão vinculado à Secretaria da Justiça e Cidadania do Estado (Sejus), composto por 12 conselheiros e que tem como presidente José Cláudio Souto Justa, representante da Comunidade, e como vice-presidente a representante do Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), promotora de Justiça Camila Gomes Barbosa, emitiu, nesta sexta-feira (06/01), Nota Pública sobre a crise que assola o sistema prisional do país.

No documento, produzido por causa das tragédias registradas nos estados do Amazonas e de Roraima, o COPEN apresenta uma série de medidas que acredita que devem ser adotadas para evitar que os tristes fatos ocorridos no Norte do país se repitam no Ceará.

Confira a nota na íntegra:

No romper do ano de 2017, houve (mais) uma tragédia no sistema prisional brasileiro, desta vez no Estado do Amazonas. Numa disputa de poder entre facções criminosas em uma penitenciária com mais de 1200 presos para menos de 450 vagas, quase 60 deles foram mortos, muitos deles esquartejados e/ou decapitados. No momento em que esta nota estava sendo redigida, confirmou-se nova ocorrência de 30 mortes, desta vez em Roraima, em um presídio onde havia mais de 1400 presos para uma capacidade de 700.

O COPEN – Conselho Penitenciário do Estado do Ceará, seja em suas reuniões ordinárias e extraordinárias, audiências públicas, inspeções e notas públicas, já constatou o quadro dantesco das prisões cearenses, o que não difere muito do que acontece no Brasil: superlotação; superdimensionamento das construções; presos provisórios superando o número de condenados, mas com estes convivendo; péssimas condições de higiene; reduzida oferta de trabalho e/ou estudo interno; presença maciça de membros de facções criminosas, criando clima de animosidade entre os internos, dentre outros graves problemas.

Em outras manifestações públicas à imprensa, o COPEN já chamava a atenção para a necessidade de se obedecerem rigorosamente às regras previstas na Constituição Federal, nos Tratados e Convenções Internacionais e na Lei de Execução Penal, a fim de que a reinserção do preso na comunidade, principalmente para aqueles que foram condenados ao regime inicialmente fechado, de forma a seguir o pressuposto de gradualidade no cumprimento da pena, o que já vinha sendo observado pela então gestão do então Secretário de Justiça e Cidadania Hélio Leitão.

Entretanto, o COPEN entende que se deve pensar e discutir com seriedade e profundidade a grave crise pelo que passa o sistema prisional brasileiro não só a partir do cumprimento das regras mínimas de tratamento dos seres humanos presos, mas também a partir de políticas públicas, com mais educação, saúde, habitação e saneamento básico, já que a maioria dos que hoje se encontram encarcerados sequer tiveram oportunidades do que a de praticar crimes, notadamente o tráfico de drogas.

Aliás, a guerra às drogas, que é somente uma das facetas do endurecimento penal pelo qual o Brasil vem passando nos últimos quase 30 anos, somente produziu mais e mais encarceramento, mais e mais sofrimento, matando mais do que salvando vidas, sem a correspondente atuação do Estado para trazer condições dignas de encarceramento e de recuperação dos criminosos. Espantoso dizer que sequer temos dados confiáveis quanto à reincidência, o que mostra também que, estatisticamente, não se tem tratado com seriedade o assunto.

O COPEN compreende a necessidade de se tomarem medidas urgentes para resolver a crise no sistema prisional, e desde já se coloca à disposição para o auxílio que se fizer necessário. Todavia, assevera que a questão penitenciária jamais pode ser resolvida com privatizações, que não vem dando certo mesmo nos países mais desenvolvidos, a exemplo dos Estados Unidos da América; bem como com a construção de novas penitenciárias, ainda que geridas pelo Poder Público, pois se trata de mero paliativo, que, comprovadamente, não resolve a crise no ambiente carcerário, e dá a falsa impressão de que o problema está sendo solucionado.

Portanto, a fim de que estes fatos não se repitam, notadamente em solo cearense, com sua população carcerária em torno de 25 mil presos, sendo 15 mil deles provisórios, deve-se encarar o problema de frente. Para tanto, o COPEN propõe as seguintes medidas, a serem adotadas em esforço conjunto pelo Poder Executivo, Poder Legislativo, Ministério Público Estadual e Federal, Defensoria Pública Federal e Estadual, Poder Judiciário Federal e Estadual e Ordem dos Advogados do Brasil, Polícias Militar, Civil e Federal, a Secretaria de Justiça e Cidadania, bem como outros órgãos e instituições vinculados à execução penal:
a) a criação imediata de estrutura integrada para assistência jurídica sistematizada e permanente a todos os encarcerados do Estado do Ceará;
b) a implementação urgente das audiências de custódia em todas as comarcas do Estado do Ceará, verificando-se também a situação prisional de todos os internos do sistema;
c) a implementação de trabalho e estudo para os internos, em todas as unidades prisionais do Estado;
d) o afastamento das lideranças das organizações criminosas que operam dentro do sistema prisional, transferindo-as para presídios federais;
e) o seguimento estrito das decisões das Cortes Supremas, que proíbem as prisões provisórias, sem julgamento, com base na gravidade abstrata da infração ou do clamor público, e que, mesmo assim, vem sendo utilizadas em grande medida pelo Poder Judiciário;
f) a adequada e inteligente alocação de recursos públicos para a estruturação e realização de políticas públicas que possam reverter o quadro de encarceramento em massa que é feito no Brasil, a fim de que a prisão deixe de ser a primeira e passe a ser a última alternativa possível no caso de prática e condenação em razão de uma infração penal;
g) a capacitação constante dos agentes penitenciários, e a contratação urgente de novos quadros, mediante concurso público;
h) a elaboração de projetos de lei que, mudando o Código Penal, o Código de Processo Penal e a Lei de Execução Penal, procure discutir abertamente a questão penitenciária, o combate ao narcotráfico e o foco da repressão penal em torno dos crimes mais graves, reservando a estes a pena privativa de liberdade,  pois, como já dizia o Ministro Márcio Thomaz Bastos, “o Brasil prende muito e prende mal”.

Fortaleza, 06 de janeiro de 2017.

José Cláudio Souto Justa – Presidente
Representando a Comunidade

Camila Gomes Barbosa – Vice-Presidente
Representando o Ministério Público do Estado do Ceará

Maria Mendes Evangelista
Representando a Comunidade

Marco Passerini
Representando a Pastoral Carcerária

Karla Andréia Magalhães Timbó Pinheiro
Representando a Defensoria Pública da União

Márcio Vítor Meyer de Albuquerque
Representando a OAB – secção Ceará

Luiz Carlos Oliveira Júnior
Representando o Ministério Público Federal

Lino Marques dos Santos Carvalho
Representando a Defensoria Pública do Estado do Ceará

Nestor Eduardo Araruna Santiago
Representando a categoria de Professor Universitário de Direito Penal, Processual Penal ou Ciências Correlatas

Orlando Bezerra Monteiro
Especialista em Psiquiatria Forense

Ruth Leite Vieira
Especialista em Criminologia e Direito Penitenciário

Augusto César Coutinho
Representando os Agentes Penitenciários

Secretaria de Comunicação

Ministério Público do Estado do Ceará

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